Há um cálculo na jogada da Santíssima Trindade (Pai, Filho e as Fakenews). A retórica libertária antissistema – “não tô nem aí”– substitui a condução política “impura”do Estado por um comando missionário “puro” da nação. Em vez de agir como governante, age intencionalmente como um mártir destemido, independente e visionário, o ELEITO, que vive o RITO do sacrifício público das desmoralizações, xingamentos e panelaços dos eleitores para se fazer MITO.
“Ser (do) contra” o seu próprio governo é uma tática para obter um poder virtuoso acima da política corruptora da “boa ordem, da boa moral, dos bons costumes”. Um jogo do ganha ou ganha de qualquer modo. Ele é a unidade na revolta: um artilheiro solitário do exército “contra tudo que tá aí”, contra si mesmo se preciso manipular for. Um artilheiro, com a língua feito mira giratória, que precisa ser perseguido por todos e injustiçado pelos seus. É assim que ele ganha novas adesões. Apresenta-se como a Grande Vítima que serve de saco de pancadas no lugar do povo simples, ordeiro e trabalhador porque é o seu Grande Irmão: aquele que apanha no seu lugar para te defender e, com isso, ter o privilégio de ser sempre o primeiro a bater em você. Ele é o combatente que, ao sobreviver a agonia de ser traído por dentro, tem a missão heroica de denunciar tudo, todos, ele mesmo. Ele, o (des)político (des)comprometido que faz e desfaz o que não fez para despolitizar o rebanho, provocando um estado de susto que alerta suas ovelhas contra as tramoias dos outros, as raposas da política. Os outros tem ideologia, ele tem a verdade revelada.
A unidade é ele, o profeta que cura o rebanho e o chefe tribal que leva a Terra sem Males. A unidade do pensamento único, totalitário-afetivo que faz crer que os ELEITORES são especiais porque foram por ele ELEITOS quando aceitaram o chamado da cruzada moral libertadora em seus corações. Foram escolhidos para viverem a sina do rebanho imunizado que reconhece a sua desigualdade como “natural” e aceita as perdas de direitos como o preço a ser pago para seguir glorioso na sanha da travessia fantasiosa para a terra prometida. Foram escolhidos para viverem diariamente as batalhas apocalípticas do juízo final porque estão curados pela palavra (des)ideologizadora.
Agora, a batalha é contra o COVID e seu exército de mensageiros e devotos (STF, parlamentares, governadores, prefeitos, ministros tomados pelos demônios da OMS, mídias, esquerdistas, etc.) para salvar vida: a vida política dele que foi eleito presidente.
*Por Jacqueline Muniz, Antropóloga. 01/04/2020
A retórica libertária antissistema – “não tô nem aí”– substitui a condução política “impura”do Estado por um comando missionário “puro” da nação