Peguei a conversa pela metade, mas não pude deixar de acompanhar até o
final. Ninguém resiste a escutar uma mulher confidenciando um segredo a
outra.
– Desde quando isso está acontecendo? – Ainda não está acontecendo, mas vai acontecer em breve.
É horrível ter que traí-lo, nunca me imaginei nessa situação. A gente
sempre se deu tão bem. Mas sinto que chegou a hora do meu turning
point. – Você conheceu outro?
– Uma colega me apresentou. Fiquei fascinada. Tão solto, tão moderno.
– Procura resistir, Marília ! Afinal, você construiu uma relação sólida de.. quanto tempo mesmo? ]
– Dezessete anos, acredita? E nunca olhei para o lado, sempre com ele, fiel como uma labradora.
Hoje é meu melhor amigo. Muito além do que qualquer outra coisa.
– E você vai arriscar perder essa cumplicidade por causa de uma tentação?
– Rê, chega uma hora em que é preciso mudar. Eu vou fazer 50 anos. Olho
todos os dias para o espelho e enxergo a mesma cara, a mesma falta de
brilho.
Estou envelhecendo sem arriscar nada, sem experimentar algo diferente,
nunca. Me diz a verdade: você acha que ele irá suportar?
– Tá brincando! Você pretende contar a ele??? – Ele vai reparar, né? Lógico.
– Não precisa falar nada, mulher! Se você for discreta, ele não vai descobrir.
– Só se eu trocasse de cidade, Rê. Ele vai ficar sabendo no mesmo dia. Você sabe como as fofocas voam.
- Se você pretende fazer essa besteira mesmo, melhor pensar nas consequências. A não ser que ele seja muito bem resolvido.
- Quem é bem resolvido numa hora dessas? Ele vai querer me matar. Vai
me chamar de traíra pra baixo. Vai se sentir um lixo de homem.
- ai Marília. Pra que inventar moda a essa altura do campeonato? Claro
que às vezes também fico a fim de experimentar uma novidade, quem não
fica? Mas, por outro lado, é tão bom não precisar mentir, não ter que
criar desculpas...
Uma amiga minha fez essa bobagem e conseguiu ser perdoada porque
garantiu que tinha acontecido uma vez só, e em Nova York! O cara
engoliu, mas a relação está estremecida até hoje, nunca mais foi a
mesma.
- eu sei, eu ei só que não aguento mais usar o mesmo corte há 17 anos.
Estou decidida, Rê. Vou trocar de cabeleireiro. Se me arrepender,
assumo as consequências. Não suporto mais ficar refém de uma situação
que é cômoda, mas que não me revitaliza.
- Então só posso te desejar boa sorte, amiga. Voou te confessar uma
coisa, mas não espalha: eu adoraria trocar minha manicure por outra
novinha que recém entrou no salão. Me diz se tem cabimento isso. Já
troquei de marido três vezes, e não tenho coragem de deixar a Suely.